domingo, 26 de julho de 2009

A GOTA D'AGUA

GOTA D’AGUA
São tantas coisas que acontecem de errado que nos sentimos desestimulados incapazes embora não percamos as nossas esperanças.

A muitos anos atrás escrevi uma carta para meu filho, pois tinha medo de morrer de uma hora para outra e ele, não saber o quanto eu o amava, essa carta, não sei como, foi parar em mãos de um repórter de um grande jornal, que me ligou e pediu para publicá-la, confesso que mexeu com o meu ego, afinal, ninguém nunca havia se manifestado daquela maneira por uma coisas que havia escrito, sei que não sou culto pois não tive a oportunidade de continuar meus estudos, porem sempre gostei de escrever, ainda mais hoje com tanta tecnologia.

Essa “carta” foi publicada no jornal como “A Carta do Pai Policial para o Filho”e fez sucesso perante meus companheiros, talvez por nenhum ainda ter se manifestado diante da opinião publica, um dos companheiros no entanto me chamou a atenção, eu o chamava de “Bebeto” pois era parecido com o jogador do Vasco da Gama, pois ele havia colocado uma copia em um quadro na parede do quarto de seu filho recém-nascido.

Eu fiquei empolgando pelo sucesso que uma simples carta tinha tido e comecei a escrever uma historia, inventei um personagem que era Policial Militar e o coloquei com as experiências que alguns amigos haviam tido e que me narraram durante nossas conversas, embora com meus 48 anos, eu nunca li um livro em minha vida e havia escrito um, o qual o intitulei “ O Direito de Não Ter Direitos, a Vida de um Policial Militar” em homenagem a um Sargento que me ensinou tudo o que sei hoje e que também foi morto por marginais, ele sempre dizia que eu tinha o direito de não ter meus direitos quando eu questionava se era ou não certo fazer algo que me fora ordenado a fazer.
Falei acima “Também foi morto por marginais” pois o outro amigo, o “Bebeto” tinha sido executado na porta da sua casa, pouco tempo depois e nem deu tempo para dar um livro para ele que tanto queria e me incentivou.
E mais uma vez a mídia tomou conhecimento, e me pediu que desse uma entrevista sobre o livro para fazerem uma reportagem e eu concedi, ao tomarem conhecimento através da reportagem de uma pagina, fui chamado a atenção e como punição, fui remanejado quinze vezes em um ano, só por ter falado sobre meu livro e não sobre a Policia a qual me sentia capacitado porem não estava autorizado.

Alguns viravam seus rosto para mim e nem se aproximava para falar ou cumprimentar, porem a maioria me felicitava pela minha iniciativa, era como se eu tivesse feito algo que eles sempre desejaram fazer mas não tinham coragem, eu sempre ouvi um ditado que sigo a risca, “Colherás hoje o que plantou no passado”, talvez tenha sido isso que me mantinha de cabeça “em pé” pois já havia presenciado tantas coisas, tantas injustiças que me sentia “forte” para tentar mudar tudo, uma delas foi a morte de quatro cavalos na Unidade que servia, por fome, pois a Policia não havia comprado ração para eles, um crime acobertado pela cúpula da época, no qual me senti cúmplice por ter recuado quando coloquei as fotos em um jornal e me “disseram” para retira-las para não dar complicação para mim.

Me senti incapaz e novamente fraco e omisso, “rodei” de batalhão em batalhão, ia e voltava de um lado para o outro, longe da minha família e amigos, alguns “Oficias” embora não o fizessem abertamente para não sofrerem represarias, me apoiavam como “chefes de setores” me solicitando para ver se acabava com a minha “dança”, pois em alguns lugares, a ordem era de “pegar um furo” para que pudessem me punir severamente, no entanto quando me sentia amparado era novamente movimentado, porem a cada dia ou a cada movimentação eram novos amigos que fazia e me ajudavam até mesmo com palavras amigas de incentivo.
Fui parar no 12º BPM, onde estavam trocando o Comando por suspeita de corrupção, pois haviam publicado em um jornal que o Comandante era corrupto após escreverem no muro da Unidade, assumindo o então Ten Coronel Marcus Jardim, que logo no inicio do seu comando me chamou no campo de futebol e me ordenou que assumisse a sargenteação da 2º CIA, e que acabasse com qualquer coisa que envolvesse dinheiro, me lembro que eram 258 homens, e todas as viaturas que cobriam a nossa área, embora nunca tivesse assumido uma sargenteação administrava de forma transparente, sabia o dia em que o colega tinha sua segurança, sua faculdade e algum problema para resolver, fazia seus FUSPOM, seus triênios e tudo que precisavam sem nunca cobrar nada, pois era o meu dever não só como seu sargento mas principalmente como seu amigo, os defendia a ponto de alguns Oficias me chamavam de “Advogado do Diabo” pois ainda ajudava a responder seus “DRD” ( Documento de razão de defesa) baseado nas Leis e “regras” as quais havia sentido na própria pele, me lembro de um caso, em que um deles foi questionado “por ter demonstrado MEDO durante uma incursão a uma favela” e tantos outros, ao meu ver ridículos, pois que nunca teve medo ? porem que “mexe” com os sentimentos do Policial e interferem em suas vidas, tanto a profissional quanto a pessoal, e assim fiquei quase oito meses, embora o CMT da Unidade conquistasse o respeito e admiração de toda a sua tropa, alguns Oficias ainda agiam de maneira “soberana” e aos poucos eram “mudados” pelo CMT ate quase ter uma harmonia plena, onde todos estavam satisfeitos com o Comando e desenvolvendo suas funções naturalmente sem serem acuados
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Durante a minha “turnê” presenciei diversas injustiças e a cada dia aumentava a minha revolta, escrevi uma letra de musica, o Cod 800 auxilio policia, onde a letra retrata na integra a nossa vida sem tirar nem por, conversei com um amigo que é musico, Wagner Caetano, e ele fez a melodia que ficou ótima e gravamos em seu estúdio, dessa vez eu mesmo fui aos Jornais, precisava mostrar que eu não concordava com tudo aquilo que presenciava, precisava dizer que nos Policias Militares éramos as vitimas e não os vilões, cedi uma reportagem em três Jornais que deram um destaque de uma pagina completa no domingo. Na sexta feira me apresentei ao meu Comandante, Coronel Marcus Jardim e relatei o fato que iria acontecer, me colocando a disposição para ficar preso, pois sabia, embora estivesse na “Borda do copo” para derramar, que não podia ter feito, porem acho que as pressões sobre nos não são mensuradas, pois já presenciei muitos amigos que se desabafaram e ate choraram diante de injustiças que sofreram, porem o meu CMT, durante seu relato ao seu Superior pelo telefone, assumiu o meu lado, dizendo que não iria me prender por me julgar um dos melhores Sargentos que ele conhecia, e que a musica que eu havia escrito era muito boa e ele havia gostado e que iria comigo, na segunda feira, me apresentar ao Sr CMT Geral.

E assim foi, a musica (COD 800 auxilio Policial) Fez um sucesso, ate entrevista ao vivo eu dei, ate mesmo o CMT Geral havia gostado, logo depois vieram as Eleições para o cargo de Deputado Estadual, fui procurado por alguns integrantes de partidos e convidado a vir candidato, eu aceitei, pois pensava que poderia fazer muito mais coisas com o Poder nas Mãos, fiz uma campanha de “pobre’ , pois o pouco que tinha eram dos meus filhos e eu não iria gasta-lo com papeis, meu carro havia “batido o motor” e eu andei de ônibus pedindo votos, tive 1213, achei ótimo, pois foram de coração, porem as minhas expectativas de me tornar o representante da Família Policial Militar tinha acabado, embora eu fosse conhecido não era reconhecido, voltei para a minha Unidade onde tive a honra de trabalhar nas Relações Publicas e ser diretamente subordinado ao Sr Cel Marcus Jardim, que já deixou de ser um Comandante para ser tornar um Líder para mim, pois um comando seguimos por sermos obrigados a seguir e já um Líder o seguimos de coração.

Algum tempo depois, ele foi promovido e transferido para algo melhor para ele, e eu fiquei na Unidade, voltei para os meus serviços no canil, porem não parei de expor meus sentimentos, fiz alguns “Comerciais” de campanha de valorização do Policial Militar, e os coloquei no You Tobe, conheci o Maj Wanderby, que me convidou para participar de um movimento de alguns Oficiais, intitulado “Os Barbonos”, fui na primeira reunião e logo na entrada fui surpreendido por ser o único praça presente, me lembro que quando cheguei haviam muitos praças na porta que conversei, pensava que eles também iriam participar porem eles só tinham ido para levarem seus comandantes, eu entrei e me senti estranho, alguns cochichavam ao me olhar, no entanto me mantive, pois quando tive uma oportunidade de falar, eu me apresentei e disse que se eles estavam ali reunidos para decidirem o meu destino e da minha família, era um dever e uma obrigação eu esta ali presente, pode parecer ridículo para alguns, mas estar participando de um momento histórico era muito bom, pois pensava que tudo havia mudado, e que o sentimento de revolta e injustiça havia surgido em todos nos, um momento de União, e fui convidado pelo próprio líder do Movimento para continuar, talvez para mostrar aos Praças que aquele que sempre lutou e nunca se escondeu estava ali presente, a cada reunião o salão enchia, e estava vendo a hora de uma real mudança, no entanto, ao meu ver, não tiveram a coragem, e a oportunidade se foi, ainda tinham algumas “fagulhas” em passeatas, mas o discurso era o mesmo, enalteciam os “Barbonos” e nunca o Policial Militar, e com toda a razão não houve a adesão dos Praças, pois nunca fizeram nada por nos, e de uma hora pra outra tudo havia mudado, para mim era uma oportunidade, pois era só continuarmos a nos unir para demonstrarmos força contra o sistema e conseguirmos o que precisávamos, independente das reais intenções de alguns “Barbonos” , fui censurado por alguns amigos por participar de alguns atos e ate dizerem que eu estava com os Oficias, pois para alguns, há a diferença, para mim somos todos Policias Militares, não os condeno por pensarem assim, afinal a uma grande diferença entre nos, pois o mesmo erro só há punição para um e não para o outro, me juntei a outro movimento, só que dessa vez era só de praças, e mais uma vez estava eu lá no meio, porem ao contrario do primeiro movimento, as intenções eram explicitas, apoiar politicamente um candidato já estabelecido por eles, para as próximas eleições, eu também fui contra, pois achava que teríamos que percorrer as Unidades, e delas extrairmos um representante que queira e que seja escolhido pela tropa, para depois escolhermos um entre eles, que seja capacitado e compromissado com a família Policial Militar, para o elegermos para lutar por nossos Direitos.

Sei que já tivemos alguns que conseguiram, porem de nada fizeram, talvez uma coisinha ou outra, mas a dedicação plena para nos, isso nunca aconteceu, talvez por a maioria achar que somos fracos e desunidos, no entanto, qualquer outro que apareça dizendo nosso “Defensor” nos ilude e os apoiamos devido a carência de termos realmente um Líder entre nos.

Alguns que nunca sentiram frio, fome, sede, sono, cansaço, medo, injustiças e tantas outras coisa que sentimos durante nossos trabalhos, se dizem estar ao nosso lado, sem ao menos entender o que somos realmente, levantam nossa bandeira e fazem promessas que seriam inviáveis de ser cumpridas e nos iludimos, iludimos nossas famílias e nossos amigos para tentarmos resgatar um pouco de dignidade e respeito.
Como havia dito no inicio, São tantas coisas que acontecem de errado que nos sentimos desestimulados incapazes, coisas que nos revoltam como exemplo ouvir de um “superior” que as viúvas dos companheiros são prostitutas, que o companheiro que reformou não manda em mais nada, de chegar em um Hospital nosso , que descontamos todos os meses para atendermos nossos filhos e não ter medicos, e tantas outras coisas que me envergonho as vezes de ser o que sou, ao saber que o meu maior inimigo esta ao meu lado, me abraçando ou apertando a minha mão, infelizmente o descaso é nosso.
Eu participei do CONSEG-RJ na esperança de termos algumas necessidades supridas, embora, particularmente esteja um pouco receoso, pois acho que tudo não passa de uma encenação política, porem quero crer que não, que seja mais uma oportunidade que nos tenha dado e tenho que acreditar, graças a Internet, onde exercemos nossos Direitos Constitucionais como Cidadãos Brasileiros, expus através do Orkut e desse Blog a minha indicação e de mais quatro Praças para irem a Brasília agora em agosto, no entanto não houve muita adesão, talvez por medo ou por não ter sido como deveria ser, divulgado entre nos, pois dependeria de cada um passar a diante esse fato, assim como passamos os “Bizus” que nos iludem.

Deixei meus emails e recebi alguns, que pretendo levar para o novo Comandante Geral, algumas idéias que me foram passadas que ajudariam a amenizar nosso sofrimento, pois acredito que ele possa ser um “Marco” em nossa historia, e possa fazer alguma coisa que nunca fizeram embora tivesse oportunidade, por isso que acredito mais uma vez que temos chance de resgatar nossa Dignidade e nosso Respeito.
É bom deixarmos explicito que não sou candidato a mais nada e que faço isso e apoio pois os meus filhos serão beneficiados com as melhorias que alcançarmos.

Acho ridículo eu com vinte e nove anos de Policia, sempre agindo de maneira correta e digna, ter que ser sustentado por minha mãe, não é vergonha eu dizer isso, vergonha seria se eu roubasse, e assim como eu tantos outros com tantos problemas, alguns fáceis de serem resolvidos, não ha o interesse em ajudá-los, porem quando “explodem” os excluem e se eximem de qualquer culpa para mostrar a sociedade que eles é que foram culpados. Sempre disse que não há mérito em excluirmos os que mancham nossa imagem e sim a vergonha de termos deixado entra em nossas fileiras.
Torço para os Blogs continuarem a sua luta, suas denuncias, porem não devemos ter medo de “Botar a cara” pois acho que estamos lutando por uma causa justa, pois acredito que alguém , algum dia ira olhar por nos, e ver que nunca deixamos de lutar e acreditar.
Pois não sou nada, ninguem, sem força, sem estimulos e agora sem esperança embora continue...

Ricardo Garcia
Cidadão Brasileiro